terça-feira, 4 de outubro de 2011

Repensando a neutralidade dos fatos científicos

Neste último sábado, o Ciência em Foco exibiu o filme Obrigado por fumar (Thank you for smoking, 2005), de Jason Reitman, seguido da fala do professor do NCE e do HCTE da UFRJ, Ivan da Costa Marques. Sua fala, intitulada "Alegar que cigarros não viciam requer provas", abriu um proveitoso debate no qual se discutiu a construção de verdades científicas e se repensou a importância política atribuída ao conhecimento científico na atualidade, com a atenção voltada aos processos que ajudam a moldar e fixar determinadas certezas.

Ivan iniciou sua apresentação com um elucidador trecho de outro filme, Uma mente brilhante (A beautiful mind, 2001), de Ron Howard. A partir da cena em que o personagem mostra a arbitrariedade presente na forma de uma constelação - já que ela possui determinada forma apenas para observadores específicos, sob determinada perspectiva - , Ivan introduziu sua proposta de leitura de Obrigado por fumar, um filme que, de acordo com ele, apresenta questões atuais que dizem respeito a reflexões em torno da sociologia e da antropologia da ciência. Diante da realidade que o filme nos apresenta, o que seria um fato científico? O que seria uma prova? O filme nos permite pensar em um cenário complexo, nos quais os elementos com os quais a ciência lida não se descolam dos fluxos que atuam em sua formação, em sua co-construção.

Um fato científico, equiparado a uma crença, a uma convenção, passa a existir apenas na relação que estabelece com elementos materiais, objetos e sujeitos que possuem uma história. É a justaposição de elementos de diversas ordens que constitui aquilo que passa a ser entendido como uma prova científica. Com o filme, percebemos que um fato científico não é estabelecido ou imposto de forma própria, ou apenas no laboratório - um lugar purificado no qual se desnudariam mistérios da natureza - , mas nas relações entre os advogados, os lobistas, o público e o mercado. Entra em cena a retórica, que mobiliza as emoções e invoca a autoridade científica com o objetivo de convencer o público da legitimidade de um fato.

Neste sentido, não há mais a ambição da epistemologia clássica, que buscava descobrir verdades na natureza. Na perspectiva contemporânea pensada a partir do filme, não existiriam "descobertas científicas": toda verdade científica é negociada. Ivan citou um belo e instigante exemplo: uma molécula só existe porque há um instrumento para fotografá-la. Assim como as formas projetadas a partir das estrelas de uma determinada constelação, as verdades científicas passam a ser questionadas quando se problematiza sua neutralidade, sua universalidade, abrindo espaço para uma época tanto de incertezas como de possibilidades éticas. Fiquem ligados, pois, em breve, publicaremos a entrevista com o Ivan, que excepcionalmente não pôde ir ao ar antes do último sábado.

Nossa próxima sessão acontece no dia 5 de novembro. Exibiremos o filme Donnie Darko (2001), de Richard Kelly, e teremos a honra de receber, como convidado do mês, Erick Felinto, que é professor do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UERJ, membro fundador e diretor científico da Associação Brasileira de Pesquisadores em Cibercultura (ABCIBER). Doutor em Letras pela UFRJ, Erick é autor do livro A imagem espectral: comunicação, cinema e fantasmagoria tecnológica. Anotem e divulguem!


4 comentários:

  1. Infelizmente não pude ir a esse último cineclube, mas espero para ouvir o audio da palestra e rever o filme em questão =) Espero que dê pra ir no próximo. Está na hoa de rever Donnie Darko!

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  2. Olá, Clarissa. Os podcasts estão sendo editados e serão postados em breve! Esperamos você no encontro do dia 5!!! =)

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  3. Olá! Eu fui nesse debate e gostaria de ter o podcast pra passar pra minha turma da faculdade; então, quando ele será disponibilizado? Obrigada!

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  4. Olá, Renata. Até o final do ano conseguimos disponibilizar esse podcast. Estamos trabalhando nas edições anteriores para recuperar o atraso ;) De nada! abçs!

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