sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

A poesia da ciência

Poesia, ciência e filosofia. Como todas essas coisas se combinam? Ouça o podcast com o professor do Depto. de filosofia da UFRJ Fernando Santoro sobre o filme "2001: uma odisseia no espaço" e descubra. Vamos nessa?
Clique abaixo para ouvir a palestra (58min.) ou baixe aqui o arquivo zipado (68MB).







quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Videocast - Imagens da prisão / Fernanda Bruno

2013 foi um ano de muitas transformações no cenário nacional. O Rio de Janeiro, em particular, futura sede de grandes eventos esportivos, acompanhou desde junho o crescimento da insatisfação da população com relação ao modelo de cidade global e suas consequências para os habitantes, desencadeando importantes discussões em torno da mobilidade urbana, as desigualdades sociais, a qualidade de vida, as tensões entre a esfera pública e a privada e a liberdade dos indivíduos. Despontando nas grandes manifestações como um contraponto à grande mídia, as narrativas audiovisuais independentes ganharam um protagonismo e um alcance político estratégico, já que permitem não apenas o registro de fatos pouco noticiados, como também garantem a construção colaborativa das perspectivas dos manifestantes, funcionando como uma importante ferramenta de contra-vigilância às forças de repressão.

Em outubro, às vésperas de outra manifestação no Rio, o Ciência em Foco exibiu o filme Imagens da prisão (Gefängnisbilder - Alemanha, 2000), de Harun Farocki, seguido da palestra Técnicas e estéticas da vigilância: corpo, imagem e máquina, ministrada pela nossa convidada do mês, Fernanda Bruno, professora do PPGCOM e do Instituto de Psicologia da UFRJ. O filme de Farocki serviu como ponto de partida para uma conversa bastante atual em torno das tecnologias de vigilância e o uso político das imagens, partindo da arquitetura das prisões nas sociedades modernas até o uso dos smartphones nos protestos que movimentam o país desde junho. Às vésperas do final de um ano intenso, o blog do Ciência em Foco apresenta abaixo o videocast da palestra de outubro, convocando a todos para refletir acerca de questões que nos são bastante próximas (e urgentes).






sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Quem é você?

Uma viagem no tempo e no outro! Eis o convite do podcast de outubro sobre o documentário “Santiago”, com a participação do professor de psicologia Luis Antônio Baptista. Vamos juntos?
Clique abaixo para ouvir a palestra (77min.) ou baixe aqui o arquivo zipado (94MB).







terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Fim de ano e inauguração de cineclube no Cinema Nosso

Quem achou que o ano já havia acabado para o circuito cineclubista está enganado!

Nesta terça, 17/12, o espaço cultural Cinema Nosso convida para a inauguração do cineclube da Associação Brasileira de Documentaristas e Curtametragistas do Rio de Janeiro. Seis curtas fazem parte da programação: Amanhecer (2009), de Mariana Campos; Prum Santo (2013), de Gordack; Na Roda de Samba (2013), de Andre Di Kabulla; Desalmados -­ O Vírus (2012), de Raphael Borghi; Antônio Galdino, Mestre do Barro (2013), de Mário Vieira da Silva e Reikwaapa­ Ritos de passagem Guarani (2013), de Ricardo Sá e Werá Djekupé. A sessão se inicia às 18h30 e contará com debate sobre os temas abordados nos filmes, após a exibição.

Na quarta-feira, dia 18/12, também às 18h30, acontece uma sessão especial do cineclube do espaço, com cinco curtas internacionais: o Prêmio Alemão de Curta-metragens, cuja seleção de filmes abrange ficção, experimental, animação e documentário. A programação completa com as sinopses pode ser encontrada aqui.

O Cinema Nosso, tradicional espaço cultural na Lapa, fica na rua do Rezende, 80. Mais informações na página do Facebook, ou pelo telefone (21) 2505-3300. Uma boa sessão a todos, e boas festas!




segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Videocast - Dr. Fantástico / Henrique Cukierman

Há dois meses inauguramos o nosso videocast, que nada mais é do que a veiculação em vídeo digital das palestras dos convidados do Ciência em Foco, no canal do YouTube da Casa da Ciência da UFRJ. Os links diretos para as palestras ficarão armazenados aqui no blog, na seção Videocast.

A primeira palestra a ir ao ar, As máquinas de informação e o mundo fechado da guerra fria, aconteceu em março de 2013 após a exibição do filme Dr. Fantástico, de Stanley Kubrick, e foi ministrada por Henrique Cukierman, doutor em Engenharia de Produção pela COPPE/UFRJ, professor do PESC/COPPE, da Escola Politécnica da UFRJ e do Programa de Pós-Graduação em História das Ciências, das Técnicas e Epistemologia (HCTE/UFRJ). Confira abaixo:




terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Como se morre na atualidade?



No último sábado, aconteceu o encerramento da temporada 2013 do Ciência em Foco. Foi exibido o filme Você não conhece Jack, de Barry Levinson, seguido da palestra Autonomia individual e gestão do morrer na contemporaneidade, ministrada pela médica Rachel Aisengart Menezes, doutora em Saúde Coletiva pelo IMS/UERJ e professora do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da UFRJ (IESC/UFRJ). A partir de um olhar sobre a trajetória de Jack Kevorkian, patologista que iniciou o debate em torno da eutanásia e do suicídio assistido nos EUA, Rachel comentou temas que dizem respeito à autonomia individual frente ao momento da morte, que em nossa cultura é desfavorecida em detrimento da autoridade do saber médico.

A palestra e o debate apresentaram elementos para se discutir o modelo da morte moderna e a proposta dos cuidados paliativos no final da vida, em perspectiva com as outras formas de se relacionar com o morrer ao longo da história. Foram abordados os novos critérios para se definir a morte, impulsionados pelas novas tecnologias aplicadas à medicina no século XX, bem como as definições de vida e identidade. As consequências deste cenário movimentam debates éticos e políticos que atravessam a atualidade, nos convidando a repensar não apenas a maneira com que lidamos com a morte, como também as relações entre corpo, saúde, ciência e sociedade. A discussão trazida na nossa sessão de encerramento dialogou, de forma própria, com as questões tratadas pelas nossas demais sessões ao longo da temporada 2013, nos fazendo relembrar a dimensão política do conhecimento e das imagens, inseparável dos mesmos processos que animam a vida e a arte.

O Ciência em Foco retorna no ano que vem. A sessão inaugural coincide com a véspera do dia da marmota, um curioso feriado local na América do Norte ligado à previsão do tempo e do clima, eternizado pelo cinema. Portanto, no dia 1º de fevereiro, exibiremos o filme Feitiço do tempo (Groundhog day - EUA, 1993), seguido da palestra Do tempo, o que se diz?, ministrada pelo poeta e matemático Ricardo Kubrusly, professor do Instituto de Matemática da UFRJ e coordenador do Programa de Pós-Graduação em História das Ciências e das Técnicas e Epistemologia da UFRJ (HCTE/UFRJ). Fiquem ligados no blog para a chegada de mais videocasts e podcasts, e para maiores informações. A equipe agradece o apoio e o carinho de todos ao longo do ano e aproveita para desejar um feliz ano novo!







terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Você não conhece Jack

A partir deste mês, estamos inaugurando no blog um novo tipo de participação dos palestrantes do cineclube, com a apresentação de textos curtos e leves sobre os temas a serem desenvolvidos nos encontros, em diálogo com outros filmes, textos e imagens. 

A convidada de dezembro é a médica e doutora em saúde coletiva Rachel Aisengart Menezes.

Inicialmente este filme seria lançado no cinema, mas a produção decidiu lançá-lo apenas na TV, o que ocorreu em 2010. Baseado no livro de Neal Nicol and Harry Wylie, publicado em 2006, "Between the Dying and the Dead: Dr. Jack Kevorkian, the Assisted suicide Machine and the Battle to Legalize Euthanasia", a versão final do filme e a caracterização do personagem central, vivido por Al Pacino, foram aprovadas por Jack Kevorkian.

O filme aborda um tema que cada vez mais tem sido debatido no Ocidente, a partir da segunda metade do século XX e, especialmente, no XXI: a gestão do processo do morrer e o direito de autonomia individual. Neste sentido, Jack Kevorkian é porta-voz de críticas aos excessos do poder médico, entre as décadas de 1950 e 1980, quando houve uma espécie de “deslumbramento” com as novas tecnologias voltadas ao diagnóstico de doenças, à criação de novas formas de criação e de manutenção e/ou para o prolongamento da vida.

O médico Jack Kevorkian defendeu a ideia de que o ser humano tem o direito de morrer da forma que considerar mais “digna”, no caso de doenças terminais. Apoiado pelo amigo Neal Nicol e por sua irmã Margo Janus, ele passa a prestar uma "consultoria de morte". Assim, Jack ajudou na concretização de mais de uma centena de suicídios assistidos. Segundo divulgado em sites sobre o filme, esta seria a razão do apelido de Dr. Morte. Contudo, este apelido é anterior à proposta de ajuda para doentes alcançarem o alívio de seu sofrimento, pela interrupção da vida – seja por suicídio assistido ou pela eutanásia. O apelido de Dr. Morte surgiu durante o período da faculdade, quanto ele fotografava os olhos dos pacientes mortos. Nessa época Kevorkian se tornou popular, ao defender que órgãos de pacientes mortos fossem retirados para transplantes. Jack se formou como médico patologista e se tornou chefe do setor de patologia do hospital de Detroit, ficando até o final dos anos 1970, quando passou a se dedicar a ajudar pacientes terminais a porem fim a suas vidas, por considerar que toda pessoa tem o direito de encerrar a própria vida, e que o médico deve auxiliar na execução deste ato, para que seja indolor. Em 1988 ele inventou a Tanatron, uma máquina do suicídio. Com ela o doente conseguia, ao tocar em um botão, injetar drogas em seu organismo, para morrer sem dor ou angústia respiratória.

O tema da gestão da morte pelo aparato médico já havia sido abordado em outros filmes, como Filadélfia, de 1993, sobre a AIDS; Wit, uma lição de vida, de 2001; Mar adentro, de 2004 e Uma prova de amor, de 2009 – entre outros. Com ênfases diferenciadas, todos estes filmes explicitam a importância do desejo do doente, no que tange às decisões sobre o término da própria existência.









Com o advento e a criação de recursos inovadores para a criação, manutenção e o prolongamento da vida, surgem novos termos, concernentes a cada nova condição de existência. Assim, tratamento fútil, encarniçamento terapêutico, obstinação terapêutica, cuidados paliativos, entre outras expressões, passam a integrar o vocabulário de doentes com diagnóstico de enfermidade crônico-degenerativa, como por exemplo, câncer, AIDS terminal e/ou outras patologias de longa duração, como enfisema pulmonar, esclerose lateral amiotrófica (o filme Hilary and Jackie aborda o tema, a partir do caso da violoncelista Jacqueline du Pré) ou demência de Alzheimer (sobre este tema, ver o filme Iris).





Diante de cada nova possibilidade – como se deu tanto com a criação do respirador artificial, com a possibilidade de doação e transplante de órgãos, quanto com a reprodução assistida e suas diversas modalidades – faz-se necessária a formulação de novas normas e leis, em cada contexto. Cada condição inovadora incita uma produção de sentimentos – sejam eles de aceitação ou de recusa das novas condições – e de esperanças. Ideais de vida – e de morte – são elaborados por diferentes grupos, em cada cultura e/ou sociedade. Neste sentido, para uns, a morte “com dignidade” pode ser alcançada com suporte de equipe de cuidados paliativos, enquanto para outros, seria aquela resultante de eutanásia ou de suicídio assistido.

O século XXI tem assistido à crescente legalização da eutanásia e do suicídio assistido, em diferentes países, bem como à ampliação das possibilidades de atuação médica no último período de vida de doentes com doenças crônicas sem possibilidades terapêuticas de cura – ou, em termos mais correntes, pacientes terminais. Tais normas e leis passaram a ser incluídas no rol dos direitos humanos – por se tratar do direito a não sofrer – integrando o conjunto de políticas públicas de saúde, em vários países do Ocidente. Diretrizes são formuladas pela ONU e OMS, no que tange à assistência deste tipo de doentes e, também, acerca das capacidades e limites da atuação médica.

O filme sobre Jack Kervokian não aborda somente as ideias de um médico. Ele contém dados sobre o que o filósofo Giorgio Agamben denominou de zoe e bios: o corpo político e o corpo biológico – duas condições distintas, que fundamentam o direito de decidir pelo término da própria existência, quando esta não apresenta mais a possibilidade de fruição do viver. O tema do filme não é de fácil assimilação – nem deve ser – mas merece atenção e reflexão, por sua relevância na atualidade.


Rachel Aisengart Menezes
Médica, doutora em Saúde Coletiva pelo Instituto de Medicina Social da UERJ (IMS/UERJ), professora do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da UFRJ (IESC/UFRJ) e autora do livro Em busca da boa morte: antropologia dos cuidados paliativos. Ela é a convidada de dezembro do Ciência em Foco.

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

A tecnologia e a ressignificação das imagens


A sessão de outubro do Ciência em Foco apresentou o filme Imagens da prisão (Gefängnisbilder - Alemanha, 2000), de Harun Farocki, seguido da palestra Técnicas e estéticas da vigilância: corpo, imagem e máquina, ministrada por Fernanda Bruno, professora do PPGCOM e do Instituto de Psicologia da UFRJ. O filme de Farocki serviu como ponto de partida para uma conversa bastante atual em torno das tecnologias de vigilância e o uso político das imagens. No filme, o diretor recupera imagens de arquivo associadas à dinâmica de controle de várias instituições, como as prisões, as escolas, os asilos manicomiais, e produz uma montagem que as articula com cenas resgatadas da história do cinema. O resultado, à primeira vista estranho – já que as imagens institucionais não são feitas para serem contempladas esteticamente –, vai aos poucos se mostrando como uma potente forma de discutir o poder das imagens e também promover um olhar crítico sobre elas. Com este método, Farocki traça uma pequena história da vigilância, desde as sociedades modernas e disciplinares e chegando até o mundo contemporâneo – desde a arquitetura das prisões, passando pela chegada das câmeras de vigilância até os atuais softwares de monitoramento dos espaços, que hoje invadem a vida cotidiana nas grandes cidades. Fernanda comentou aspectos destas tecnologias de controle e suas estratégias de disciplinarização dos sujeitos. Desdobrando sua análise para além do filme, Fernanda apontou outras tecnologias associadas à vigilância, agora no espaço informacional da internet. As ferramentas de busca e redes sociais dependem cada vez mais do rastreamento das informações pessoais que os usuários fornecem em sua navegação.

Após um extenso mapeamento de diversas tecnologias de vigilância e monitoramento, Fernanda comentou a particularidade dos smartphones, que possuem câmera e acesso à internet. Na medida em que permitem uma contra-visualidade, os smartphones são ferramentas que podem atuar como uma espécie de resistência às tecnologias de controle, oferecendo uma contra-vigilância. Foram citados os exemplos dos protestos políticos que ocorreram em escala mundial desde 2010, até os recentes acontecimentos na cidade do Rio de Janeiro. A imensa circulação de imagens promovida pelos milhares de indivíduos, com uma lógica distribuída, não hierárquica, produz uma paisagem audiovisual articulada a uma nova espécie de arquivo, uma nova cena imagética, não mais restrita às grandes corporações ou instituições que tradicionalmente detêm a produção de imagens.

A dinâmica da circulação das imagens pode, em situações de conflito como as recentes, oferecer uma resistência ao aparato de vigilância que historicamente penetrou no cotidiano. Foi o caso, por exemplo, da contra-vigilância com relação à polícia, quando manifestantes filmam a ação policial em protestos, e o produto da filmagem é utilizado para desmentir versões oficiais dos fatos. De acordo com Fernanda, temos hoje um outro tipo de observador, um observador distribuído, com uma dinâmica descentralizada que desafia os sistemas hierarquizados de visão e os discursos das instituições convencionais. Desde as provocações trazidas pelas imagens colocadas em relação por Farocki, pode-se entrever e pensar um cenário contemporâneo que embaralha e confunde a paisagem convencional da vigilância, na qual havia uma separação mais definida entre os vigilantes e os vigiados. Fiquem ligados: em breve a palestra estará online na íntegra em nosso Videocast.



sexta-feira, 22 de novembro de 2013

A minha morte diz respeito a quem?



No dia 7 de dezembro, o Ciência em Foco apresenta o filme Você não conhece Jack (You don't know Jack - EUA, 2011), de Barry Levinson, acompanhado da palestra Autonomia individual e gestão do morrer na contemporaneidade, com Rachel Aisengart Menezes, médica, doutora em Saúde Coletiva pelo IMS/UERJ e professora do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da UFRJ (IESC/UFRJ). A exibição tem início às 16h, na Casa da Ciência da UFRJ.

Instigante e polêmico, o filme traz Al Pacino no papel do advogado e doutor Jack Kevorkian, defensor da prática do suicídio assistido e da eutanásia para pacientes em casos terminais. Nos EUA, a defesa dessa postura diante de casos de “sobrevida” dividiu a opinião pública e provocou a ira de promotores, que se opuseram às “consultorias de morte” prestadas por Kevorkian a mais de cem pacientes que optaram por uma morte com dignidade.

Essa temática será abordada pela doutora Rachel Aisengart Menezes, possibilitando “refletir sobre os sentidos e os sentimentos em torno do sofrimento decorrente de doença e, em última instância, sobre a morte e autonomia individual, no século XX”.

Rachel Menezes observa que “o filme conduz ao questionamento de diferentes possibilidades ao final da vida, como qualidade de vida e de morte, sofrimento, autonomia individual, sistema de crenças, entre outras”.

Al Pacino ganhou com sua atuação neste filme, também exibido como minissérie na TV, o Prêmio Emmy de melhor ator, e Adam Mazer o de melhor roteirista.

sábado, 2 de novembro de 2013

Os universos do pensamento e da história



A perda de uma posição “geográfica”, por assim dizer, no Universo é chamado usualmente de “Princípio Copernicano”. Ele nos diz que a Terra é um planeta como outro qualquer, ao redor do sol, que é uma estrela como todas que brilham no céu, que nossa galáxia é apena uma entre centenas de bilhões etc. É, a princípio, um princípio de mediocridade, por assim dizer. Mas ele mesmo é um contraponto de uma aposta fundamental (...)

Jaime Fernando Villas da Rocha, astrônomo e historiador, doutor em Astronomia pelo Observatório Nacional, professor da UNIRIO e palestrante do Ciência em Foco de novembro.

1) Por que pensar com o cinema?

Imagem e tempo. Imagem e ação. Reprodutibilidade técnica. O Cinema, como a Astronomia ou a História, em seus terrenos, reúnem articuladamente um conjunto de representações e linguagens antes menos comunicantes. De certa forma, é a arte que se utiliza das possibilidades de nossa civilização tecnológica para realizar esta síntese, abrindo a possibilidade de pensar estas representações, esta civilização tecnológica inclusive.





2) Contato é um filme baseado no livro de ficção-científica do astrônomo e divulgador de ciência Carl Sagan, que contribuiu com a produção e faleceu pouco antes de ver o filme pronto. A evolução do conhecimento científico desdobrado de áreas como a astronomia legou à humanidade uma posição cada vez mais afastada de uma posição central no Universo. Comente a respeito desta propriedade da ciência e das possíveis perspectivas éticas que ela oferece.

A perda de uma posição “geográfica”, por assim dizer, no Universo é chamado usualmente de “Princípio Copernicano”. Ele nos diz que a Terra é um planeta como outro qualquer, ao redor do sol, que é uma estrela como todas que brilham no céu, que nossa galáxia é apena uma entre centenas de bilhões etc. É, a princípio, um princípio de mediocridade, por assim dizer. Mas ele mesmo é um contraponto de uma aposta fundamental: a de que a física do universo é uma só e, portanto, podemos conhecê-lo como um todo e em detalhe a partir do conhecimento que construímos aqui na Terra. Podemos fazer modelos de como são os interiores das estrelas sem nunca ter tocado em uma. Podemos descrever processos que se passaram no Universo como um todo em uma época tão primeva que não podemos observar etc. Porque a realidade é una.

Por outro lado, aprendemos muito sobre o fato de a vida complexa exigir condições muito especiais para ocorrer. Neste sentido, nosso planeta, nosso satélite natural, nossa vizinhança imediata, nossa estrela, nossa posição na Via Láctea e nossa Galáxia como um todo são de alguma forma especiais para que vida complexa possa acontecer. Ademais, nem a época em que acontecemos poderia ser qualquer nem a gramática das leis da física poderia ser qualquer para vida acontecer. Aprendemos muito com o quanto especial somos e quão específico é o momento do Universo em que acontecemos.



3) Em âmbito nacional, percebemos hoje uma ênfase nos discursos políticos que apelam para o desenvolvimento e à técnica. Por outro lado, também percebemos uma crescente visibilidade de fundamentalismos religiosos ligados ao cenário político. De que forma você percebe a atualidade do filme, tendo em vista as discussões que ele põe em cena envolvendo o embate entre os discursos da técnica, da ciência e da religião atrelados ao plano democrático das decisões políticas? 

Este é um ponto central para mim. Minha filósofa favorita, Hannah Arendt, por coincidência objeto de um filme recente, identificou em Kant uma diferença fundamental nas atividades mentais e uma tragédia cultural nossa. A diferença é a que existiria entre as esferas do pensar e do conhecer, cada uma com sua categoria específica: a esfera do pensar teria por categoria a criação de sentido, enquanto que o conhecimento tem por critério a Verdade. Nossa tragédia seria a de que pensamos o pensamento, desde Platão, com o critério de verdade e não de sentido. Isto permite que dimensões associadas ao sentido, como as religiões, se apropriem do critério de verdade tendo como contraponto a apropriação do conhecimento construído para negar sentido à experiência religiosa. E o terreno da política, que é a esfera do pensamento em ação, se vê contaminado por estas apropriações indevidas. Ao impor critérios de verdade, com seu apelo de absoluto, impedimos o embate de diferentes visões, que é a esfera da política.

Junte-se a isto o fato de que, mesmo em ciência, o próprio critério de verdade é relativizado, e temos preparado o terreno para a possibilidade de emergência de fundamentalismos embasados em nossa tradição de pensamento.



4) A astronomia é uma ciência que tem muitas afinidades poéticas com o cinema, desde o seu substrato comum – a luz – até a dependência de elementos que remetem à visualidade. A astronomia também lida em grande parte com o tempo, e com o passado daquilo que podemos hoje observar. Como você percebe as relações possíveis entre a astronomia e a história, tendo em vista sua formação em ambas as áreas do conhecimento?

A Astronomia é uma ciência histórica e arqueológica. Inescapavelmente. Ela lida com a realidade e a realidade acontece. Isto significa um conjunto de possibilidades que se reorganizam permanentemente. Cumpre compreender o acontecido dentro deste quadro de possibilidades.

Para tal, como a história entre as ditas ciências sociais, a Astronomia reúne articuladamente diversos ramos do conhecimento, como Física, Química, Biologia etc. Ao mesmo tempo, de um ponto de vista cosmológico, temos acesso ao nosso passado como um todo imediatamente. A luz tem uma velocidade finita, então de quão mais distante nos chega a informação, mais do passado ela provém. Assim, nosso agora é o centro de esferas temporais do passado de nosso Universo e é assim que temos de empreender um trabalho arqueológico sobre estas camadas. Isto altera nossa perspectiva sobre a mediocridade a que estaríamos relegados pelo “Princípio Copernicano” inclusive.



5) Contraplanos - expresse em poucas palavras (ou apenas uma) sua sensação com relação aos sentidos e problemáticas evocadas pelas seguintes palavras: conhecimento e memória; fé e razão; vida.

Identidade. Acontecer. Pensar.

6) Roteiros alternativos - espaço dedicado à sugestão de links, textos, vídeos, referências diversas de outros autores/pesquisadores que possam contribuir com a discussão. Para encerrar essa sessão, transcreva, se quiser, uma fala de um pensador que o inspire e/ou seu trabalho.

Eudoro de Souza - "Horizonte e Complemetariedade"

Hannah Arendt - "A Vida do Espírito"

7) Gostaria de lançar aos que acompanham nosso cineclube uma pergunta-síntese provocativa acerca da problemática de queira tratar em sua palestra?

Pensar é uma viagem para o além?

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

As viagens e suas revelações

 
O filme Contato, dirigido por Robert Zemeckis (EUA, 1997), será apresentado no próximo Ciência em Foco, dia 2 de novembro, acompanhado da  palestra  Catábases modernas – As permanências da memória de nossa tradição de pensamento, com Jaime Fernando Villas da Rocha. Astrônomo e historiador, doutor em Astronomia pelo Observatório Nacional e professor da UNIRIO, Jaime pretende refletir sobre esta incursão ao “mundo dos mortos” (catábase) em busca de conhecimento, fundada na mitologia grega. Trata-se de “realizar uma viagem para o além-mundo e dele retornar trazendo uma revelação aos homens. Tais viagens transcendentes estão presentes na genealogia de nossa tradição de pensamento. Sem ter a pretensão de fazê-lo, a obra Contato concebida pelo astrônomo e divulgador americano Carl Sagan acaba por produzir uma viagem com muitos aspectos que, a meu ver, são identificáveis aos de uma catábase, com a especificidade de se dar sob os auspícios públicos de uma sociedade moderna”.
No filme, Jodie Foster, no papel principal, é uma cientista do SETI (Busca por Inteligência Extraterrestre, em português) e que busca por contato com alguma civilização extraterrestre. Eleanor Arroway (Ellie) é uma radioastrônoma que consegue, depois de longa e obstinada pesquisa, descobrir um sinal extraterrestre transmitido a partir da estrela Vega. Este sinal contém um conjunto de informações entre as quais aparecem instruções para construção de uma máquina de transporte espacial.
O palestrante convidado aproveita essa temática “para discutir aspectos da tradição de pensamento ocidental, particularmente aqueles relacionados às atualíssimas temáticas da técnica e da religião na política.” Ele destaca que o filme aborda uma celebração da vida através da presentificação que a memória social permite.

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Em cartaz, o livro do cineclube Ciência em Foco

Clique na imagem para ampliar o convite.

A espera terminou! Nesta terça-feira, 22 de outubro de 2013, acontece o lançamento do livro Ciência em Foco, volume II: pensar com o cinema, a aguardada segunda publicação do Ciência em Foco. Organizado por Gabriel Cid de Garcia, o livro reúne artigos dos pesquisadores convidados do cineclube realizado na Casa da Ciência da UFRJ desde 2009, e cada um desdobra perspectivas situadas na interface entre o cinema e diversas áreas do conhecimento.

O coquetel de lançamento será às 19h, na Blooks Livraria (Praia de Botafogo 316). A livraria fica no Espaço Itaú de Cinema. Veja a imagem do convite abaixo para maiores detalhes.

O livro conta com as colaborações dos seguintes pesquisadores: Maria Cristina Franco Ferraz, Braulio Tavares, Patrick Pessoa, José Ricardo Ramalho, Paulo Roberto Vasconcellos-Silva, James Arêas, Lucia de La Rocque, Ieda Tucherman, Renato Noguera, Paula Sibilia, Ricardo Kubrusly, Ilana Feldman, Fernando Vidal, Jorge Vasconcellos e Lilian Krakowski Chazan. Prefácio de Charles Feitosa.

O Ciência em Foco, criado em 2004 como iniciativa do Museu de Astronomia e Ciências Afins (MAST-MCTI), teve seu primeiro livro publicado em 2008. Desde 2009 o Ciência em Foco é realizado na Casa da Ciência da UFRJ, e firmou-se como uma atividade que privilegia a relação entre cinema e pensamento, introduzindo abordagens críticas e problematizadoras no contexto da divulgação científica e abrindo espaço para as artes, a filosofia e as ciências humanas.

Mais informações podem ser acessadas aqui e na página do evento no Facebook. Um bom lançamento, e boas leituras (e bons filmes!) para todos.



sexta-feira, 11 de outubro de 2013

A tênue fronteira entre sonho e realidade

Bem-vindo ao mundo dos sonhos! Está no ar o podcast de setembro sobre o filme “A origem”, com a participação do doutor em História das Ciências, Técnicas e Epistemologia Nelson Job, que vai discutir a realidade dos sonhos. Feche os olhos e boa viagem!
Clique abaixo para ouvir a palestra (70min.) ou baixe aqui o arquivo zipado (64MB).







terça-feira, 1 de outubro de 2013

Os olhos das máquinas



O Ciência em Foco, dia 5 de outubro, apresenta o filme Imagens da prisão, de Harun Farocki (Alemanha, 2000), seguido da palestra Técnicas e estéticas da vigilância: corpo, imagem e máquina, com Fernanda Bruno, doutora em Comunicação e Cultura, professora do PPGCOM/UFRJ e do Instituto de Psicologia da UFRJ.

A expansão e o aprimoramento da tecnologia de visualização e monitoramento de espaços públicos, comunidades e populações amplificam os mecanismos de vigilância social, a tal ponto que a possibilidade de estar sendo visto gera uma zona de incerteza quanto ao sentido deste olhar. Como observa Fernanda, trata-se de um “sentido que transita entre o controle e a liberdade, a segurança e a ameaça, o policial e o libidinal, a suspeita e o cuidado, a inspeção e o entretenimento”.

Harun Farocki, cineasta tcheco radicado na Alemanha, trabalha neste documentário com imagens de câmeras de vigilância de prisões, extraindo, a partir de uma edição e montagem perspicazes, uma leitura crítica sobre as práticas disciplinares destes estabelecimentos de detenção.

Harun nasceu em 1944, na República Tcheca. Desde 1966, realizou mais de 100 produções para a televisão e o cinema. A partir de 1996, realizou várias exposições coletivas e individuais em museus e galerias. Desde 2006, é professor catedrático da Academia das Artes Visuais em Viena, Áustria.

Fernanda destaca que “o cinema de Harun Farocki explora de modo contundente as relações entre técnicas e estéticas da vigilância, desde os aparatos industriais-disciplinares até os mais recentes dispositivos de controle e consumo. Em cada um desses contextos, corpo, imagem e máquina se articulam de modos particulares”.
Venham pra cá!!!

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Cineclube na UFF convida para nova temporada



Estreia a nova fase e programação do cineclube do GRECOS (Grupo de estudos sobre comunicação e sociedade), sob coordenação da Professora Ana Lúcia Enne, do Depto. de Estudos Culturais e Mídia e do PPCULT/UFF!

Para começar, na terça que vem (1/10), será exibido o filme Trabalho Interno (Inside Job, EUA, 2010), no campus do Gragoatá da Universidade Federal Fluminense, às 18:30, sala 301/bloco A.

Após a exibição, haverá debate a partir do filme. Na pauta: a crise do capitalismo pós-2008.

Em breve, será divulgada a programação completa do cineclube. Fiquem de olho: http://anaenne.wix.com/grecos

Evento gratuito! Participem!

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Onde está o sentido da vida: aqui ou acolá?



O que salta aos olhos na história da filosofia é que a busca de sentido da vida ou para a vida em geral encontra ‘solução’ em hipóteses transcendentes, como se o sentido da vida, que é vivida e experimentada na imanência da vida singular, no mundo sensível, se localizasse ou fora dele, ou numa verdade essencial que o guiasse, André Martins, filósofo e psicanalista, doutor em filosofia pela Université de Nice e em Teoria Psicanalítica pela UFRJ, professor da UFRJ e palestrante do Ciência em Foco de setembro.


1) Por que pensar com o cinema?


A arte em geral força a pensar, porque nos afeta intensamente, sendo assim um fator de mudança psíquica, de transformação. Enquanto um entretenimento diverte, nos tirando da rotina, mas não nos força a pensar, a arte, para receptores minimamente sensíveis, consegue, pela emoção, não uma catarse, mas uma transformação. Afinal, todo pensamento inevitavelmente se inicia na experiência sensória, ou seja, numa experiência estética.

O cinema, em particular, tem recursos de imaginação e de identificação intensos, com um potencial de nos afetar, nos tocando e nos levando a uma transformação de maneira ainda mais forte, unindo história, som, imagem, recursos de enquadramento, de narrativa, de cores, fotografia, música etc. Um envolvimento sensório complexo e, portanto, com um potencial afetivo de grande intensidade.

2) Vários pensadores problematizaram a busca pelo sentido da vida. Podemos dizer que é uma das questões fundamentais que movem, por excelência, a investigação filosófica. No entanto, ao longo da história do pensamento ocidental, diversas foram as formas elaboradas para se entender o conhecimento e a relação do homem com o mundo, ora incorporando ou ora distanciando-o de suas paixões e afetos. Quais seriam algumas das implicâncias históricas destas formas de se entender a vida, e sua influência em nossa cultura?


O que salta aos olhos na história da filosofia é que a busca de sentido da vida ou para a vida em geral encontra ‘solução’ em hipóteses transcendentes, como se o sentido da vida, que é vivida e experimentada na imanência da vida singular, no mundo sensível, se localizasse ou fora dele, ou numa verdade essencial que o guiasse. Em outras palavras, buscou-se sempre uma teleologia, causas finais para a vida ou para a existência. Em contraponto, experimentou-se um forte niilismo, um sentido de vazio, de falta de sentido.

Um dos pontos fortes do filme Um lugar na plateia é que o sentido da vida, de uma maneira extremamente próxima do que Nietzsche propõe em sua filosofia, está na própria experimentação estética da vida, não como um dandy mas ao contrário, por pessoas singulares que buscam fazer o que gostam e mesmo dentro daquilo que gostam buscam uma realização que nunca se dá de uma vez por todas, mas como uma vida que se deixa guiar por nosso instinto mais forte, por aquilo que nos move, nos faz sentir vivos, pulsando, nos expressando.

3) No filme Um lugar na plateia, percebemos um retrato particular e atual das relações humanas em um grande centro urbano. Seus vários personagens buscam um sentido para suas vidas. No entanto, como pensar esta busca diante das dificuldades e dos possíveis obstáculos que podem levar ao ressentimento e à resignação? 

Então, eu não diria que eles buscam um sentido para a vida. Eles já estão vivendo o sentido de suas vidas, o que infelizmente não é o caso de muitos, ou mesmo da maioria das pessoas, em geral. O que eles estão experimentando é o desejo de sempre expressarem o que para eles faz sentido, os move, os leva adiante, exatamente o que Nietzsche tenta descrever como o instinto mais forte. São personagens incríveis que não têm moralismos, que não são guiados por causas externas, que entendem que o valor da vida não está em valores padronizados, oferecidos pela sociedade como causas externas de desejo. Não há nenhum personagem niilista, todos trabalham no que gostam, não são puristas, e as questões que enfrentam são questões da própria vida, quando lidamos bem com ela. São todos autênticos e leves em seus dramas existenciais. Por isso é um filme muito forte, que me emociona a cada vez que o revejo. É um filme que trata de um tema essencial da existência humana individual e coletiva. 


4) Embora as imagens, em sua qualidade sensível, tenham sido por muito tempo relegadas a um domínio inferior no âmbito do pensamento filosófico, o advento do cinema ajudou a reposicionar sua potência quando associa a imaginação ao tempo, ao instante que passa, e os afetos que é capaz de produzir. Neste sentido, de que modo seria hoje possível articular os aspectos comuns entre a criação artística e a filosófica?

Perfeito, hoje uma filosofia não mais ingênua, e também que não incorra na ilusão do tecnicismo filosófico, entende que a filosofia é sempre resolução de problemas existenciais e estéticos. Sempre, direta ou indiretamente. Podemos afirmar com segurança que a criação filosófica é uma criação artística, que o filósofo é um artista, e que todo público da filosofia, como todo público da arte, ao se deixar afetar e modificar pelo pensamento que é suscitado, desencadeado pelo contato com a arte – incluindo aí a filosofia, seja um livro ou uma aula – está revivendo a experiência da criação artística, em seu sentido mais singular e, portanto, político, fazendo a experiência de um pertencimento singular e não submetido à vida e à coletividade humana em geral e social em particular. 



5) Contraplanos - expresse em poucas palavras (ou apenas uma) sua sensação com relação aos sentidos e problemáticas evocadas pelas seguintes palavras: imanência; transcendência; ética. 
imanência: experiência estética da vida;

transcendência: idealização em geral defensiva;
ética: compreensão dos afetos, de si e do outro.

6) Roteiros alternativos - espaço dedicado à sugestão de links, textos, vídeos, referências diversas de outros autores/pesquisadores que possam contribuir com a discussão. Para encerrar essa sessão, transcreva, se quiser, uma fala de um pensador que o inspire e/ou seu trabalho.
Filmes: Paris (2008) de Cédric Klapisch, com Juliette Binoche; O destino (1997) de Youssef Chahine.

Livro: de André Martins, Pulsão de morte? Por uma clínica psicanalítica da potência (Ed.UFRJ, 2009).

Pensadores: Spinoza, Nietzsche, Winnicott.

7) Como conhecer mais de suas produções?
Meu site está em construção, e deve ser lançado em dezembro de 2013, no endereço: www.andremartins.inf.br Nele, reunirei meus artigos, vídeos, entrevistas, agenda, etc. O site de meu grupo de pesquisa, SPIN, também precisa de algumas atualizações: www.gr-spin.org.br

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Que sentido a vida tem?


No dia 7 de setembro, o Ciência em Foco apresenta o filme Um lugar na plateia (Fauteuils d'orchestre, 2006), da cineasta Danièle Thompson, com Cécile De France (Albergue espanhol, Bonecas russas) no papel principal. Logo após a sessão, será apresentada a palestra “Reflexões sobre o sentido imanente da vida”, com o filósofo e psicanalista André Martins - doutor em Filosofia, pela Université de Nice, França, e em Teoria Psicanalítica, pela UFRJ. Professor da UFRJ, André Martins publicou vários livros, dentre eles, Pulsão de morte? Por uma clínica psicanalítica da potência (Ed. UFRJ, 2009).

O filme se contagia da efervescência cultural de Paris, que deslumbra a jovem Jéssica (De France), interiorana que esperava trabalhar no luxuoso Hotel Ritz, mas terá que se contentar com a vaga de garçonete em um café na Avenue Montaigne. O local fica próximo a um teatro, a uma sala de concertos e a uma casa de leilões, o que faz com que Jéssica, volta e meia, sirva pessoas da classe artística e se envolva em suas expectativas de vida. As aspirações de Jéssica e sua inocente visão de mundo contrastam com a sofisticação dos habitantes da capital e nos faz pensar sobre o que nos permite viver intensamente a vida.

Ao destacar esta comédia romântica como indutora do debate sobre o sentido da existência, André traça breve perfil dos personagens: “uma interiorana à procura de luxo, uma atriz em crise de autoestima, um pianista insatisfeito no auge de sua carreira, um colecionador de arte que não encontra mais o mesmo sentido naquilo que o moveu por toda a sua vida, um intelectual preconceituoso fixado em suas ideologias, (...) todos em busca de um sentido imanente à própria vida”.

Segundo o filósofo, a busca dos personagens pelo que é imanente à vida afirma “algo da ordem de uma liberdade interna, de um sentimento de potência e de realização”. Trata-se de compartilhar com o mundo nossa percepção singular, subjetiva, diz André, que foi identificada de diferentes formas por pensadores como Nietzsche, Spinoza e descrita por Winnicott como simplesmente “sentir-se vivo”, em contraposição ao sentimento de futilidade da existência”.

Dia 7, esperamos por vocês!

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Arte, ciência e ficção



No dia 3 de agosto, o Ciência em Foco exibiu o filme A máquina do tempo (The time machine - EUA, 1960), clássico de George Pal baseado no livro de H.G. Wells. Após o filme, o professor do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Semiótica da PUC-SP, Jorge de Albuquerque Vieira, apresentou a palestra Ficção e produção de conhecimento. Embora o filme também convide a um debate sobre a filosofia do tempo - o que poderia levar a uma série bem mais longa de encontros - a preocupação tanto de Pal quanto de Wells parece se voltar a outras áreas da ciência, levantando questões ligadas à sociologia, à economia e à política. Neste sentido, o filme consegue traduzir o espírito da obra de Wells, ao colocar em cena a preocupação com um possível destino da espécie humana. Tanto o filme de Pal quanto o livro de Wells motivaram a discussão em torno do que significa uma ficção.  Afinal, por que criamos ficções? Seria a ficção uma espécie de produção inútil, passível de ser entendida como uma mera distração? Jorge indagou se a ficção não teria uma finalidade cognitiva, aproximando-a de características do conhecimento: todo conhecimento tem como principal função manter a sobrevivência de um sistema vivo. Toda troca com o ambiente já se configuraria como uma espécie primitiva de conhecimento. Como pensar o fato curioso de nós, humanos - supostamente seres mais complexos na escala evolutiva -, nos dedicarmos a criar ficções?

Se a produção de conhecimento ficcional parece ter uma certa finalidade, haveria algum motivo para que certas ficções fossem inventadas. Vejamos a arte: os artistas lidam com a ideia de possibilidade, com as realidades possíveis, e não diretamente com aquilo que seria real. Não seria uma condição tão distante da ciência, que se baseia em uma hipótese de natureza realista-objetivista: admite-se uma realidade e procura-se guiar por ela. Todos os critérios e refutações científicas são sempre baseados nesta possível realidade, que parece não depender de nós. Portanto, o fato de se prever realidades é uma estratégia evolutiva baseada na tentativa de se entender não apenas o que a realidade é, mas o que ela pode ser. Dos tipos de conhecimento baseados em possibilidades o mais representativo deles, além da própria ciência, é a arte. Pode-se encontrar estudos de possibilidades da realidade na maioria dos autores de ficção científica, não apenas com ênfase na ciência mas na poesia ou na sociologia - esta bastante enfatizada por Wells em "A máquina do tempo". Muitas pessoas concebem o conhecimento científico separado do conhecimento artístico, como dois domínios excludentes. No entanto, aqueles que já se envolveram profundamente em atividades de pesquisa científica já devem ter se deparado com momentos de impasse, diante dos quais só nos resta criar, inventar. A partir destes casos, percebemos que o conhecimento científico não se reduz a uma mera descrição do real, já que a realidade nunca nos é dada. Como a maior parte dos aspectos da realidade estão profundamente afastados de nós, só nos resta um jeito quando queremos conhecê-la: lançar mão da invenção, fabular uma realidade e depois testar a invenção com rigor, conjecturas, sem esquecer que o que estamos submetendo a teste são ficções. Passamos, portanto, a dar certos atributos a criações que descrevem bem o mundo.

Jorge trouxe o exemplo da teoria da curvatura do espaço-tempo quadridimensional, que aparece na discussão do início do filme. De acordo com ele, as grandes teorias científicas são ficções: a partir de testes, recolhem-se indícios que mostrem, de modo indireto, se determinada ideia é boa. Einstein buscou indícios da curvatura do espaço-tempo apenas após experimentar um momento de criação, de invenção, que se aproxima do conhecimento artístico. É por isso que os grandes avanços científicos podem ser considerados atos de criação. Dividindo as ficções em dois grandes grupos, teríamos as ficções puras e as ficções eficientes, ou seja, de um lado as ficções mais ou menos livres e, de outro, as ficções mais ou menos especificadas, no sentido de serem eficientes na descrição ou representação de uma realidade fora do nosso alcance. No entanto, estes dois tipos não se contaminariam? Jorge trouxe um exemplo desta contaminação quando lembrou de suas leituras de ficção científica na adolescência, quando travou contato com o livro "A nuvem negra" (The dark cloud, 1957), de Fred Hoyle. Seu interesse pelo romance se deveu aos seus interesses de pesquisa científica naquela época. Anos mais tarde, já trabalhando com radioastronomia, descobriu que o autor do romance não só era um cosmólogo inglês, como também que seu livro de ficção tornou-se referência para muitos pesquisadores sobre as discussões científicas em torno de possibilidades de vida no Universo. Aquilo que ele havia conhecido como ficção científica, anos atrás, havia se tornado modelo científico anos mais tarde. Deste modo, longe de ser uma mera atividade supérflua, dispensável, não seria arriscado dizer que toda atividade artística é produção de conhecimento, assim como a ficção. Quando se faz ficção, ainda que não se saiba, procura-se captar alguma possibilidade do real. Muitas vezes essa conexão existe, independente do artista.

Há um motivo para isso, parece, de natureza evolutiva. Os seres humanos interagem com a realidade recolhendo os seus sintomas e depois codificando-os em suas redes neuronais. Deste modo, os sinais da realidades nos atingem e deverão ser traduzidos, transduzidos. Toda codificação, no entanto, possui limitações. As representações que criamos para lidar com o mundo e sobreviver são limitadas, além de extremamente especializadas, em comparação com outras espécies. A história evolutiva individual de cada um define os "filtros" seletivos a partir dos quais percebem e se relacionam com o real, englobados na concepção de Umwelt: termo que designa "mundo em torno", "mundo em volta", o universo perceptual de cada espécie, na concepção do biólogo estoniano Jakob Von Uëxkull (considerado hoje o pai da biossemiótica). Deste modo, a umwelt humana delimitaria aquilo que nos coube no jogo evolutivo. A questão passa a ser: como descobrir algo que se encontra para além da nossa percepção biológica individual? A resposta se insinua na nossa capacidade de expandir este nosso universo perceptual, na medida em que ele se torna não meramente biológico, mas também psíquico, psicossocial, social e cultural. Somos capazes agora de criar ficções, ao recorrer a signos para representar certos aspectos da realidade fora de nosso universo biológico. Na perspectiva de Jorge, nenhuma ficção é completamente pura, mas sempre baseada em uma possibilidade real. Do mesmo modo, estaríamos sempre lidando, na nossa experiência do mundo, com processos criativos ligados à produção de conhecimento. Estes processos não seriam restritos a determinadas áreas ou domínios, mas provariam antes a necessidade de sua mútua contaminação.

Nosso próximo encontro acontecerá no dia 7 de setembro. Exibiremos o filme Um lugar na plateia (Fauteuils d'orchestre - França, 2006 - 106 min.), de Danièle Thompson. Após a projeção, teremos a honra e a alegria de receber, como convidado do mês, o filósofo, psicanalista e professor da UFRJ André Martins, doutor em Filosofia pela Université de Nice, França, e em Teoria Psicanalítica pela UFRJ. Ele apresentará a palestra Reflexões sobre o sentido imanente da vida. André já publicou vários livros, dentre eles, “Pulsão de morte? Por uma clínica psicanalítica da potência” (Ed.UFRJ, 2009). Na ocasião, também sortearemos alguns exemplares de seus livros publicados. E por falar em livro, em breve acontecerá o lançamento do nosso segundo volume, Ciência em Foco, volume 2 - Pensar com o cinema, uma co-edição entre a Casa da Ciência da UFRJ e a editora Garamond, com o apoio do CNPq. Fiquem ligados no blog para mais informações. Até o dia 7 de setembro!








quarta-feira, 31 de julho de 2013

Qual o papel evolutivo da criação artística?


"Acredito que a afetividade, mais especificamente, a bondade, sejam tipos de conhecimento. Nossas sociedades, notadamente as ocidentais, têm ignorado muito destas dimensões; mas é óbvio que sem tolerância e acolhimento entre os seres vivos não há muita esperança para o futuro", Jorge de Albuquerque Vieira, Doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, professor aposentado pelo Departamento de Astronomia da UFRJ, professor da PUC-SP e da Faculdade Angel Vianna e palestrante do Ciência em Foco de agosto.

1) Por que pensar a partir do cinema?

O cinema é um tipo de arte e em nosso trabalho consideramos tipos de artes como produtores de conhecimento; ou seja, a Arte não é mero entretenimento, mas sim uma característica evolutiva de nossa espécie, visando sempre a uma adaptação maior a uma realidade complexa.

2) O filme A máquina do tempo é baseado na obra de H.G. Wells, um dos clássicos da literatura de ficção científica inglesa. Tendo em vista o potencial especulativo destas obras com relação à realidade, capaz de projetar cenários ficcionais que provocam o pensamento acerca do nosso próprio mundo, de que modo seu caráter científico se articula ao artístico?
O caráter científico apóia-se no conhecimento que Wells tinha da ciência de sua época; ele nasceu em 1866 e ao longo de sua vida dedicou-se mais à Biologia (interagindo muito com Thomas Huxley) e, mais tarde, a publicações em Sociologia, Política e Filosofia. Tinha ideias pacifistas e socialistas. Sua produção máxima em ficção é do período de 1895 a 1900 (os dados acima foram retirados da contra-capa do livro “A Máquina do Tempo”, Francisco Alves, 1981).



Os escritores de ficção, embora não todos, possuem a característica de imaginar fatos “não existentes”, seja agora, ou no passado ou no futuro. É comum a preocupação mais atilada quanto ao futuro, quando eles têm formação científica e filosófica, avaliando as consequências das ações do ser humano no destino da própria espécie. Isso pode ser por meio de discursos fortemente científicos, como em alguns textos de Isaac Asimov, ou mesmo poéticos, como em Ray Bradbury. Wells situa-se a meio caminho entre essas duas posturas: ciência e sociologia, por exemplo. “A Máquina do Tempo”, “Os Primeiros Homens na Lua”, “A Guerra dos Mundos”, são típicos dessa tendência. Nestes casos, a criação artística identifica-se com a criação científica. Lembremos que a produção científica não se resume à forma de conhecimento discursiva, com ênfase na lógica: ela contém, geralmente no início de uma pesquisa, um caráter tácito e imaginativo que é mais típico da Arte. Fazer boa ciência implica fazer também algo com qualidade estética.

3) O senso comum associa a ideia de ciência à ideia de verdade, normalmente identificada a partir de métodos rigorosos que permitiriam uma leitura objetiva do real. De forma análoga, a ficção é comumente entendida como meio de afastamento daquilo que diz respeito à realidade. No entanto, ciência e ficção dialogam a todo momento. De que forma se dá esse diálogo, e como estes dois domínios se relacionam?

É um diálogo necessário, porque não temos acesso direto à realidade objetiva. O que acontece fora do nosso cérebro tem que ser devidamente codificado em neurônios, com todas as limitações que neurônios e codificações possuem. Essas limitações, resultantes de adaptações que se revelaram eficientes ao longo da nossa evolução, demarcam o que é chamado em Biosemiótica de “Umwelt”, a interface entre a objetividade da realidade e a nossa subjetividade. Parece-me visível que fazer ciência, principalmente a mais avançada, exige a produção de signos, em nossa “Umwelt”, para representar aquilo que parece existir objetivamente, mas fora do alcance de nossa elaboração perceptual. Atos de criação.



Por exemplo, ao que tudo indica existe algo associado ao espaço-tempo que representamos como “curvatura”; ela está fora do nosso alcance perceptual, adequado a três dimensões, mas testes (perguntas bem feitas à realidade) científicos fotografam, embora de maneira indireta, os resultados da curvatura do espaço-tempo ao alcance de “nossas” três dimensões. Imaginamos, sempre indiretamente, uma curvatura quadridimensional e buscamos comprovar isso pelos seus reflexos em três. Imaginação e criação.

A Arte me parece um tipo de conhecimento que trabalha possibilidades do real, explorando fortemente o nosso conhecimento tácito e nossa imaginação e, no caso da pesquisa científica, orientando a produção de teorias avançadas e de modelos. Este é um ponto de confluência entre os dois tipos de conhecimento.

4) As duas sociedades que habitam o mundo no futuro, no filme de George Pal, podem ser entendidas como desdobramentos possíveis de certas características atuais da civilização, como o ideal de progresso e a desigualdade social. Como pensar as tensões entre o progresso científico e a ética, situando a produção de conhecimento como dimensão política?

Creio que uma tentativa de avaliar esse problema consiste em considerar outros tipos de conhecimento, além da ciência e tecnologia. A Ética, por exemplo, é componente da Axiologia, a teoria dos valores. A questão é que nosso conhecimento, ainda primitivo, é complexo, já que tem que lidar com uma realidade muito, muito complexa. Conhecemos “bem” alguma coisa quando este conhecimento, acima de tudo, é capaz de nos manter vivos, permanentes no tempo. O papel evolutivo do conhecimento é a sobrevivência. O que pode nos destruir é a crença no sucesso e suficiência de um único tipo de conhecimento e o abandono de outros. Uma sobrevivência complexa em meio ao complexo só me parece possível quando elabora valores e outros aspectos de nossa vida. Por exemplo, acredito que a afetividade, mais especificamente, a bondade, sejam tipos de conhecimento. Nossas sociedades, notadamente as ocidentais, têm ignorado muito destas dimensões; mas é óbvio que sem tolerância e acolhimento entre os seres vivos não há muita esperança para o futuro. É preciso não esquecer que nossa espécie já se tornou capaz da autodestruição. Como disse Edgar Morin, o Homo sapiens sapiens é também o Homo demens.



5) Roteiros alternativos - espaço dedicado à sugestão de links, textos, vídeos, referências diversas de outros autores/pesquisadores que possam contribuir com a discussão. Para encerrar essa sessão, transcreva, se quiser, uma fala de um pensador que o inspire e/ou seu trabalho.

Jakob Von Uexkull, pai da biosemiótica. Bom livro dele: “A stroll through the worlds of animals and men”. Boa frase dele: “As únicas leis que conhecemos são as leis dos signos”.

6) Como conhecer mais de suas produções?
Os pontos principais de meus trabalhos estão contidos em 3 livrinhos, pertencentes a uma trilogia cujo título em geral é “Formas de Conhecimento: Arte e Ciência” com os volumes (1) Teoria do conhecimento e Arte, (2) Ciência e (3) Ontologia.

terça-feira, 23 de julho de 2013

a ficção desafia o conhecimento


Ciência em Foco apresenta A máquina do Tempo, filme de George Pal, seguido da palestra “Ficção e produção de conhecimento”, com Jorge de Albuquerque Vieira, Doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, professor aposentado pelo Departamento de Astronomia da UFRJ, professor da PUC-SP e da Faculdade Angel Vianna.

A ficção científica britânica data de 1960 e seu roteiro é baseado em um livro de H. G. Wells (1866-1946). Um cientista de nome George, interpretado por Rod Taylor, no final do século XIX, constrói uma máquina que lhe permite viajar no tempo. Em suas primeiras incursões, George alcança os anos de 1917 e 1944, presenciando dois conflitos mundiais. Sonhando com um futuro de paz e para escapar às adversidades que ameaçam a máquina do tempo e sua vida, ele ousa viajar ao longínquo ano de 802.701. Nele, encontra duas sociedades de descentes dos humanos, os Morlocks e os Elois, e confronta-se com novos desafios e conflitos, envolvendo-se radicalmente com o futuro dessas espécies.

O professor Jorge Vieira, partindo da temática do filme, discutirá em sua palestra o conceito de "ficção eficiente", que “revela a tentativa de lidar com possibilidades da realidade além dos nossos limites cognitivos encontrados na produção do conhecimento”.

Precursor de muitos temas que serão aprofundados em ficções científicas mais recentes, livros de H. G. Wells como O homem invisível, A ilha do Dr. Moureau e A Guerra dos Mundos, continuam a inspirar diversas versões cinematográficas. A máquina do tempo, por exemplo, teve uma nova versão em 2002; desta vez, dirigida por Simon Wells.

Esperamos por você!

segunda-feira, 15 de julho de 2013

a atualidade do passado

Mais um podcast superesperado! No encontro de agosto, a psicanalista,escritora e integrante da Comissão da Verdade Maria Rita Kehl convidou a todos para uma reflexão em torno de uma história sufocada do “corpo de todos nós”. Imperdível!
Clique abaixo para ouvir a palestra (80min.) ou baixe aqui o arquivo zipado (73MB).







quarta-feira, 3 de julho de 2013

Por que a tragédia não nos é contemporânea?



“O cinema participa de um tipo ou modo de linguagem capaz de dar carne ao pensamento”, Alexandre Costa, doutor em Filosofia, professor do Departamento de Filosofia da UFF e palestrante do Ciência em Foco de julho.
1) Por que pensar com o cinema?
Além de contar com um acervo extraordinário, reunindo ao longo de sua história uma série de obras cuja beleza e teor de pensamento são literalmente memoráveis, o cinema participa de um tipo ou modo de linguagem capaz de dar carne ao pensamento, tornando-o sensível por meio de suas imagens, de seus sons, de suas falas; dessa forma ele dispõe, potencialmente, de uma força de sedução invejável, porque apresenta, unidos, prazer e reflexão, estimulando o pensamento ao mesmo tempo que nos instiga os sentidos.



2) Além de Medeia (Medea - 1969), Pasolini possui em sua filmografia dois outros filmes que dialogam com a tragédia grega: a adaptação ficcional Édipo Rei (Edipo Re - 1968) e o documentário Apontamentos para uma Oréstia africana (Appunti per un'Orestiade africana - 1970), que acompanha os ensaios e as filmagens para uma possível adaptação de tragédias de Ésquilo no continente africano. Em todos eles, destacam-se as estratégias de atualização dos temas suscitados pelos mitos que povoam os textos clássicos. Sendo assim, como pensar a transposição e a reativação dos temas trágicos a partir do cinema?
Acho que o Pasolini é um bom exemplo de como fazer isso a que você nomeou “a transposição e a reativação dos temas trágicos” pelo cinema. É que Pasolini não nos apresenta, jamais, adaptações formais dessas tragédias que ele decidiu filmar. Se alguém não conhece o enredo dessas histórias ancestrais, não será pelos seus filmes que passará a conhecê-lo. Sua relação com as obras trágicas e, mais do que isso, com o “mundo” e o idioma que as criaram, se dá claramente por meio de uma apropriação explícita: Pasolini sabe que é preciso trair a tragédia para que ela se possa fazer atual; por isso suas traduções cinematográficas para essas tragédias gregas mostram um grande grau de intervenção do autor, no esforço de estabelecer um diálogo efetivo com o trágico, uma “voz” que ele mesmo, Pasolini, reconhece nos ser hoje tão estranha e estrangeira a ponto de não a reconhecermos, a ponto de estarmos surdos para ela. É esse, por sinal, o tema principal de sua Medeia – o que nos afasta tão decididamente do homem antigo que nos deu origem histórica? Por que a tragédia e sua poesia, a narrativa e o pensamento míticos tornaram-se progressivamente uma voz cada vez mais difusa e distante? Trata-se de um arranjo delicado, situado em perspectiva histórica: Pasolini nos faz ver que, em se tratando de Ocidente, é preciso reconhecer que aquilo mesmo que nos é berço e fundamento e que, por esse motivo, sempre nos é mais ou menos próximo, ainda que inconscientemente, é também irrecuperável, como se fosse um alfabeto perdido, dificilmente reconhecível.

3) De que forma poderíamos articular a experiência do espectador e sua relação com a cena trágica, na Antiguidade, com a experiência do espectador de cinema ao longo de sua história?



Acredito que simplesmente não teríamos como articulá-las. E este acaba sendo um bom exemplo, um possível efeito do desencontro histórico que tanto fascinará e incomodará Pasolini: o espectador de cinema já nasceu num tempo em que sua audição para o trágico, em particular, já esmaeceu; além disso, o modo de esse espectador fruir a experiência estética em geral é também tão radicalmente outro que a experiência vivida num antigo teatro grego lhe seria, ao que parece, impossível de reproduzir. A começar por essa distinção subliminar que eu acabo de fazer sem sequer tê-la percebido: um daqueles antigos “espectadores” não ia ao teatro para ver “arte” ou “entretenimento” ou qualquer outra palavra que pudéssemos usar aqui; ele ia ver a representação do que julga ser a própria realidade, posta diante de seus olhos por meio do rito e da festa litúrgica que o antigo teatro grego era; tratar as tragédias gregas tendo-as, em primeiro plano, como fenômeno artístico revela nosso anacronismo e diz, de fato, muito mais de nós do que dela, de seu tempo e de sua fala.


4) Impossível não aproveitar a oportunidade para dedicar uma das perguntas aos recentes acontecimentos das manifestações em cidades pelo Brasil, reunindo diversas bandeiras pela melhoria geral da qualidade de vida. Tendo em vista que o filme de Pasolini é uma visão sobre a tragédia de Eurípides, e levando em conta o papel político da tragédia na Antiguidade e sua relação com a vida na cidade, haveria algum modo de pensar os impasses que nosso país vive na época atual, a partir de um paralelo com a apresentação mítica ou com sua atualização cinematográfica? Sem entregar muito de sua fala, de que modo a tragédia nos é contemporânea?
Pelo que disse anteriormente, parece ficar claro que essa questão se apresenta para mim justamente pelo seu avesso. A pergunta é: como e por que a tragédia não nos é contemporânea? É basicamente sobre isso que pretendo falar em minha exposição.

5) Como conhecer mais de suas produções?
No que se refere especificamente ao meu trabalho com interpretação de filmes e crítica cinematográfica, publicamos recentemente, eu e Patrick Pessoa, um audiolivro editado pela NAU Editora, intitulado “A história da filosofia em 40 filmes”, obra resultante da mostra homônima, realizada no Teatro Nelson Rodrigues entre maio de 2009 e março de 2010. Sobre essa mostra – e também sobre a sua segunda edição, ocorrida entre 2011 e 2012 – pode-se visitar o site www.lavoroproducoes.com.br, onde será possível encontrar os áudios originais das palestras e demais informações acerca do evento. Obrigado.