"A palestra é acerca do sonhar ou vocês estão sonhando acerca de uma palestra?"
Nelson Job - pós-doutorando em
História das Ciências, Técnicas e Epistemologia pelo HCTE/UFRJ, psicólogo,
editor do blog Cosmos e Consciência e palestrante do cineclube Ciência em Foco de setembro.
De uma forma geral, os comentários acerca da obra de Nolan são
tendenciosos. O último Batman foi acusado de ser um filme
"de direita". Acredito que o diretor apenas encaixou os personagens
onde as temáticas contemporâneas que ele quis abordar se expressaram melhor.
Quando o Coringa queima a montanha de dinheiro no Batman
anterior se conclamando "o agente do caos", infiro um sorriso de
soslaio do diretor naquela cena. Se Nolan fizesse um filme com os personagens do
universo mutante dos X-Men, talvez Wolverine ganhasse contornos "de
esquerda". Mas tudo isso é apenas um comentário acerca de análises
dialéticas e ideológicas (que eu tento não fazer) em relação aos filmes. Já a
comparação com Hitchcock é precisa, tanto no que diz respeito à obra de ambos
terem desenvoltura nos quesitos "cinema autoral" e
"blockbuster", mas também porque eles trazem experiências sensórias
ao espectador para além da narrativa linear. No caso de Hithcock, o espectador
é cúmplice do diretor ao "saber mais" que os personagens, gerando uma
"borra" nos supostos limites entre obra, diretor e espectador. Nolan,
por sua vez, propõe tempos e narrativas diferentes e coexistentes, como no caso
de Amnésia e A Origem.
2) Por meio de uma narrativa que se inspira nos policiais e em elementos
do film noir, A Origem apresenta uma visão ficcional para nosso universo
dos sonhos, explorando de forma criativa suas potencialidades. Tema recorrente
na história do cinema, os sonhos passaram a conquistar o interesse científico
em uma época em que o próprio cinema surgia e florescia na Europa. Enquanto
arte capaz de criar sonhos e realidades, de que modo relacionar a realidade
criada pelos filmes - e pelos sonhos - com aquela sobre a qual atua a ciência?
Na virada do século XIX para o XX, a psicanálise teve o papel importante
de recuperar modernamente o interesse pelos sonhos. Digo
"modernamente" pois o termo implica algumas considerações relevantes
de Bruno Latour. Em outras palavras, o ônus do sonho ter sido
"sitiado" pela psicologia (em um sentido geral), ficando re(l/n)egado
a um aspecto representacional, ou seja, o sonho não teria tanta importância em
si, apenas no que ele "quer dizer", no que "está por trás"
dos sonhos. Jung deu contribuições mais interessantes, pois retomou a questão
de que o sonho deve ser assimilado, a despeito de sua técnica onírica
ser ainda muito interpretativa. Já as filosofias de Henri Bergson e María
Zambrano me permitem conceber o estatuto de ser dos sonhos, ou para usar os
termos do meu campo conceitual, uma "ontologia onírica". A partir
daí, recuperam-se concepções xamânica, taoísta, budista, hermética dos sonhos,
aliadas a algumas teorias mais especulativas da ciência, como a do físico Roger
Penrose (que são mais interessantes e profícuas que do que se observa hoje na
maioria das concepções da neurociência), compondo, assim, um campo conceitual
mais complexo e consistente para se conceber os sonhos atualmente.
3) À medida que adentram as camadas de um sonho, os personagens de A
Origem passam a experimentar o tempo de forma diferente, e até mesmo
duvidar da existência de sua realidade "original". Tanto neste quanto
em outros filmes da obra de Nolan, os personagens se defrontam com conflitos
que os fazem questionar sua existência, sua realidade e seu papel no mundo. Na
época atual, diante da fugacidade de um tempo vinculado ao progresso contínuo,
da pressa e da aceleração do ritmo e dos fluxos da vida, como abordar a forma
como experimentamos o tempo, e como criar espaço para o questionamento?
4) Contraplanos - expresse em poucas palavras (ou apenas uma) sua
sensação com relação aos sentidos e problemáticas evocadas pelas seguintes
palavras.
- Consciência: A dobra da mente sobre si mesma.
- Sonho e imagem: O sonho é um tipo de imagem.
- Sonho e imagem: O sonho é um tipo de imagem.
- Arte e pensamento: Ontologicamente inseparáveis.
- Real: Devir.
5) Roteiros alternativos - espaço dedicado à sugestão de links, textos,
vídeos, referências diversas de outros autores/pesquisadores que possam
contribuir com a discussão. Para encerrar essa sessão, transcreva, se quiser,
uma fala de um pensador que o inspire e/ou seu trabalho.
Já citei vários autores e campos de conhecimento na entrevista.
Acrescentaria: para uma relação consistente entre a filosofia de Deleuze e a
ciência, o filósofo Manuel DeLanda; para uma relação sem estereótipos e
exageros "nova era" entre a filosofia e a Mecânica Quântica, o médico
anestesista Stuart Hameroff e para um estudo sério da influência do Hermetismo
e alquimia na obra de Isaac Newton - e, por desdobramento, na ciência em geral
- a historiadora da ciência Betty Jo Teeter Dobbs.
Vou deixar aqui o link do HCTE, ou o departamento de História da
Ciência, das Técnicas e Epistemologia da UFRJ, hoje coordenado pelo matemático
e poeta Ricardo Kubrusly, onde fiz meu mestrado, doutorado e faço meu
pós-doutorado orientado e supervisionado pelo físico Luiz Pinguelli Rosa. Lá é
possível fazer um estudo consistente, ousado e transdisciplinar no Rio de
Janeiro: http://www.hcte.ufrj.br/
Cito uma frase do escritor Philip K. Dick: "A teoria modifica a realidade que descreve".
Cito uma frase do escritor Philip K. Dick: "A teoria modifica a realidade que descreve".
6) Como conhecer mais de suas produções?
Através dos meus blogs. Tem o "Cosmos e Consciência"
que tende a ser mais conceitual: www.cosmoseconsciencia.blogspot.com.br e o "Druam" que tende a ser mais ficcional: www.druam.blogspot.com.br mas ambos são, inevitavelmente, complementares.
Nenhum comentário:
Postar um comentário